Não há Direitos Humanos sem Democracia plena 

Na mesma semana em que o ministro da Justiça e dos Direitos Humanos participou na 52ª sessão do Conselho do Direitos Humanos das Nações Unidas em Genebra, Suíça, onde, entre...

Na mesma semana em que o ministro da Justiça e dos Direitos Humanos participou na 52ª sessão do Conselho do Direitos Humanos das Nações Unidas em Genebra, Suíça, onde, entre outros ditos habituais, Marcy Lopes frisou: “Angola é um Estado Democrático de Direito”. Em Luanda, o Presidente da República entendeu não participar num acto solene de abertura do ano judicial enquanto não ficar “resolvido o assunto” Tribunal de Contas.

Este posicionamento até poderia ser considerado normal se de facto se se tratasse apenas de “apelar” a um órgão de justiça para que funcione como deveria, no caso o Conselho Superior de Magistratura Judicial de Angola (CSMJA) que até então, não se pronunciou. Ainda que logo na fase das suspeições levantadas, tivesse a obrigação de instaurar um processo disciplinar e um inquérito para apurar os factos.

A atipicidade nesta actuação demonstra-se no facto de antes da nota de imprensa da presidência, em que se cita o Nº 5 do Artigo 108.º da Constituição da República de Angola (CRA), mas primeiro, o Nº 1 do Artigo 2.º, que termina com a separação de poderes e interdependência de funções, João Lourenço já tinha exercido o papel do CSMJA ao pedir que a juíza em causa apresentasse a sua demissão. E outra atipicidade aconteceu quando a juíza pede indevidamente a sua auto-jubilação ao Presidente da República e logo depois, foi constituída arguida pela Procuradoria Geral da República (PGR).

Ora, a separação de poderes nesta situação estipula que quem tem a função de nomear a juíza, não pode directa nem mesmo indirectamente, demiti-la, deve deixar o outro poder funcionar, no caso o judicial. Havendo separação de poderes, a PGR que constituiu arguida a juíza, que para todos os efeitos continua a ter o mesmo estatuto, deveria ter esperado pela autorização do CSMJA .

A atipicidade destas acções revelam a atipicidade da letra que faz coexistir num mesmo documento, a CRA, a separação e o excesso de concentração de poderes. Exaltando uma visão legalista e insana que insiste nesta possibilidade de Democracia com concentração de poderes numa só figura. Isto não é Democracia, a designação correcta é Autocracia.

O princípio da separação de poderes existe para garantir, viabilizar e proteger os Direitos Fundamentais constitucionalmente consagrados, não deveria servir para prover poder discricionário e exclusivo que captura todos os outros poderes. Desrespeitar o princípio da separação de poderes é inviabilizar os Direitos Fundamentais que se assemelham aos Direitos Humanos, partilhando valores éticos e finalidade comum de protecção da dignidade da pessoa humana.

Para ter um verdadeiro Estado Democrático de Direito é urgente mudar a actual CRA que por mais atípica que a designem, tentando “normalizá-la”, não deixa de ser irregular e contraditória. De tal modo que neste ambiente torna-se paradoxal defender e promover Direitos Humanos com um sistema de justiça que já deu vários exemplos de que não é nem conseguirá ser independente enquanto refém de um só poder.

Por uma Angola melhor!

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