POLÍCIA QUE MATA NEGROS

Negros

Black lives matter

Foto: Manifestações na África do Sul

Esperamos um pronunciamento oficial de repúdio depois do que aconteceu no passado dia 25 de Maio, em Minneapolis, no Minesota, Estados Unidos da América. Quando, durante 8 minutos e 46 segundos, um polícia imobilizou, colocando o joelho sobre o pescoço do cidadão norte-americano, George Floyd, asfixiando-o até à morte.

Desde então e apesar da COVID-19, milhares de pessoas saíram às ruas, indignadas e revoltadas com as forças policiais norte-americanas que durante décadas, actuam discriminadamente, aterrorizando a comunidade negra. Tornando homem, mulher, jovem, adolescente ou até mesmo criança, negros, um alvo preferencial. Diferenciado-os apenas pela cor da pele e por uma percepção generalizada de que negro é violento, suspeito e pouco fiável. Poderia ser só um problema dos Estados Unidos, mas não é. O preconceito em relação ao ser humano negro, infelizmente é mundial.

Daí a surpresa pela parca expressão dos dirigentes Africanos e de modo geral, a sociedade no continente que parecem insensíveis à causa e longe do que se passa nas últimas semanas nas ruas dos EUA e de algumas cidades europeias. O que se passa connosco afinal?

Os governantes Africanos não querem cuspir no prato que comem e, por isso, vergam-se em silêncio perante a imperiosa influência financeira e económica dos EUA. Por outra, o racismo não é tema entre nós e, por exemplo, não se fala abertamente de discriminação entre negros, semeada durante a colonização que fomentou a miscigenação e uma maior clivagem social entre uns e outros. Não somos um, não nos vemos como fazendo parte do mesmo bom ventre.

Sem olhar para este fenómeno, sem discuti-lo ou estudá-lo devidamente, avançamos todos, aparentemente indiferentes. Encobrindo mágoas e com dificuldade de reconhecer que a cor, o tom de pele é, efectivamente, um problema que nos divide e dividirá, enquanto não enfrentarmos esta questão sem tabus.

Encontrar conforto na nossa pele, depois de séculos de subjugação e manipulação mental é difícil, mas vital. O endeusamento caucasiano, mas sobretudo o facto de não aceitarmos a nossa pele deixa-nos reféns e sujeitos a todo o tipo de violações e assassínios de quem ousou pensar por si mesmo como Cabral, Sankara, Lumumba… É preciso recuperar e libertar essa voz, soltar narrativas próprias, genuínas que repõem a verdade sobre o que fomos e somos.

A discriminação faz parte do nosso dia-a-dia dentro e fora do nosso continente. Combatê-la pressupõe, também, reconhecer que se perpetua o racismo através das nossas estruturas organizacionais e legais, pela imitação de normas e sistemas sem nos questionarmos sobre o feito passado, o impacto presente e a consequência futura. Hoje, a nossa visão de desenvolvimento exige descoloração de hábitos, costumes e eliminação de conhecimentos ancestrais. Negar e ridicularizar toda a ciência e filosofia, poderio económico e financeiro, cultura e sabedoria que nos primórdios deram rumo a toda a humanidade.

E chegar à triste conclusão que a nossa ambição não vai além de copiar o modelo do outro, para merecer um lugar, ainda assim, de inferioridade. O alinhamento às normas ditas internacionais acentuou ainda mais as nossas diferenças e afastou-nos da urgência de as resolvermos. Pelo que é difícil marchar contra o abuso das forças policiais, porque também abusamos contra a discriminação dos mais vulneráveis porque também discriminamos.

A polícia mata e continuará a matar enquanto as suas acções continuarem a ser encobertas por governos que consideram de menor valor o grupo das pessoas pobres. Lá, nos Estados Unidos os mais vulneráveis são negros, aqui também são negros e igualmente arrancados da categoria de seres humanos e sequer merecem ser mencionados no relatório de balanço de dois meses de Estado de Emergência.

Como sempre, o que causa desconforto não se fala. E por isso, a discriminação perpetua-se. Não podemos sair à rua por Floyd ou teríamos que sair também pela zungueira Flora José e outros cinco que desde 27 de Março foram assassinados pela polícia. Todos eles negros pobres, na rua à procura de sustento, assassinados “acidentalmente” por quem só os vê como desobedientes, estúpidos, violentos e vulneráveis.

Mandele Rocha

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