Os dias sem Pai

Reportagem

Juliana e Alice sustentam os seus filhos de pai ausente. Vivem numa comunidade onde tectos e paredes são de chapa exposta ao sol, chuva e vento…

Em 2009, Juliana e os seus vizinhos na altura, foram forçados a sair da zona do Benfica, município de Talatona, em Luanda, junto à costa marítima. Viviam numa zona de risco e isso terá levado as autoridades a deslocar e desalojar mais de 500 famílias dali para o distrito do Zango.

Mãe de cinco filhos quer “a casa de bloco”, tal como prometeu o governo e não mede esforços para o sustento das crianças, fá-lo sozinha, já que o pai dos seus filhos de quem está separada há anos, sumiu.

Entretanto, uma das filhas padece de epilepsia, sofre bullying e acabou por desistir da escola. “Já fizemos vários tratamentos, não está a dar certo. Vendi as minhas coisas para o tratamento, não está a dar certo. Ela só está na mão de Deus”, desabafa.

Saindo do Zango I até ao Zango III, onde se encontra, há pelo menos 25 anos, Alice Fernandes, filha de camponeses, hoje abandonada pelo marido, algo que, segundo Alice, é frequente na localidade. 

“Muitas jovens aqui ficaram solteiras. Maior parte dos maridos eram polícias, mas não se faziam sentir”, explica Alice, acrescentando: “Eu não deixo todos os meus filhos crescerem aqui, por causa do mau comportamento daqui”. E por essa razão, a sua primeira filha, de 16 anos, vive com o irmão, nas proximidades da Vila de Viana.

Situação de algumas mães orfãs
Situação de algumas mães orfãs

Mãe que cresce órfã 

Já no Zango IV, Telma é uma jovem com dois filhos e vive com o parceiro a quem chama de “grande marido”.  A jovem perdeu os pais “há muito tempo” e lamenta não lembrar dos rostos deles. “Eu tinha uns quatro ou três anos, mas por mais que se queira ter uma vida normal, a presença da mãe e do pai faz falta”.

“Quando cometemos erros, precisamos do conselho do pai, conselho da mãe, sim eu também senti isso”, lamenta.

A viver também em casa de chapa, sem água, com carências alimentares e sem segurança, Telma quer trabalha e pede por um registo: “Quero voltar a orientar-me e voltar a estudar. Com a morte dos pais fiquei meio baralhada, os meus documentos se perderam.”

A delinquência, o consumo de álcool e a gravidez na adolescência atravessa toda a zona do Zango-Calumbo. Em 2020, só em Luanda, registaram-se 2416 casos de fuga à paternidade foram registados pelo Instituto Nacional da Criança (INAC).

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